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A história do piso de caquinhos das casas paulistas

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Mensagem por Koppe Sex Mar 25, 2016 12:45 am

24 de setembro de 2015
Caraguaweb - arquitetura.Construção.Marketing.Obras


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O mistério do marketing das lajotas quebradas

Muita gente já reparou nas casas paulistas das décadas de 40 e 50 e os tradicionais pisos de caquinho, predominantemente vermelho, tinham os cacos amarelos e pretos também. A casa dos meus avós era assim.

Pode algo quebrado valer mais que a peça inteira?

Aparentemente não. Mas no Brasil já aconteceu isto, talvez pela primeira vez na história da humanidade. Vamos contar esse mistério.

Foi na década de 40 / 50 do século passado. Voltemos a esse tempo. A cidade de São Paulo era servida por duas indústrias cerâmicas principais. Um dos produtos dessas cerâmicas era um tipo de lajota cerâmica quadrada (algo como 20x20cm) composta por quatro quadrados iguais. Essas lajotas eram produzidas nas cores vermelha (a mais comum e mais barata), amarela e preta. Era usada para piso de residências de classe média ou comércio.

No processo industrial da época, sem maiores preocupações com qualidade, aconteciam muitas quebras e esse material quebrado sem interesse econômico era juntado e enterrado em grandes buracos.

Nessa época os chamados lotes operários na Grande São Paulo eram de 10x30m ou no mínimo 8 x 25m, ou seja, eram lotes com área para jardim e quintal, jardins e quintais revestidos até então com cimentado, com sua monótona cor cinza. Os operários não tinham dinheiro para comprar lajotas cerâmicas que eles mesmo produziam, e com isso cimentar era a regra.

Certo dia, um dos empregados de uma das cerâmicas e que estava terminando sua casa não tinha dinheiro para comprar o cimento para cimentar todo o seu terreno e lembrou do refugo da fábrica, caminhões e caminhões por dia que levavam esse refugo para ser enterrado num terreno abandonado perto da fábrica. O empregado pediu que ele pudesse recolher parte do refugo e usar na pavimentação do terreno de sua nova casa. Claro que a cerâmica topou na hora e ainda deu o transporte de graça pois com o uso do refugo deixava de gastar dinheiro com a disposição.

Agora a história começa a mudar por uma coisa linda que se chama arte. A maior parte do refugo recebida pelo empregado era de cacos cerâmicos vermelhos mas havia cacos amarelos e pretos também. O operário, ao assentar os cacos cerâmicos, fez inserir aqui e ali cacos pretos e amarelos, quebrando a monotonia do vermelho contínuo. É, a entrada da casa do simples operário ficou bonitinha e gerou comentários dos vizinhos, também trabalhadores da fábrica. Ai o assunto pegou fogo e todos começaram a pedir caquinhos, o que a cerâmica adorou pois parte, pequena é verdade, do seu refugo começou a ter uso e sua disposição ser menos onerosa.

Mas o belo é contagiante e a solução começou a virar moda em geral e até jornais noticiavam a nova mania paulistana.

A classe média adotou a solução do caquinho cerâmico vermelho com inclusões pretas e amarelas. Como a procura começou a crescer, a diretoria comercial de uma das cerâmicas descobriu ali uma fonte de renda e passou a vender, a preços módicos é claro pois refugo é refugo, os cacos cerâmicos. O preço do metro quadrado do caquinho cerâmico era da ordem de 30% do caco íntegro (caco de boa família).

Até aqui esta historieta é racional e lógica, pois refugo é refugo e material principal é material principal. Mas não contaram isso para os paulistanos, e a onda do caquinho cerâmico cresceu e cresceu e cresceu e, acredite quem quiser, começou a faltar caquinho cerâmico, que começou a ser tão valioso quanto a peça íntegra e impoluta. Ah o mercado, com suas leis ilógicas mas implacáveis.

Aconteceu o inacreditável. Na falta de caco, as peças inteiras começaram a ser quebradas pela própria cerâmica.

E é claro que os caquinhos subiram de preço, ou seja, o metro quadrado do refugo era mais caro que o metro quadrado da peça inteira... A desculpa para o irracional (!) era o custo industrial da operação de quebra, embora ninguém tenha descontado desse custo a perda industrial que gerara o problema, ou melhor, que gerara a febre do caquinho cerâmico.

De um produto economicamente negativo passou a um produto sem valor comercial a um produto com algum valor comercial até ao refugo valer mais que o produto original de boa família...

A história termina nos anos sessenta, com o surgimento dos prédios em condomínio. A classe média que usava esse caquinho foi para esses prédios e a classe mais simples ou passou a ter lotes menores (4 x15m) ou foram morar em favelas.

São histórias da vida que precisam ser contadas para no mínimo se dizer:
- A arte cria o belo, e o marketing tenta explicar o mistério da peça quebrada valer mais que a peça inteira.

Crédito do Texto: Manoel Botelho é Engenheiro Civil e autor da coleção CONCRETO ARMADO EU TE AMO
Arte e publicação: CaraguaWeb


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Mensagem por Quero Café Sex Mar 25, 2016 9:43 am

Legal.
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Mensagem por Sirius Plissken Sex Mar 25, 2016 1:05 pm

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Mensagem por elcioch Seg Mar 28, 2016 11:24 am

caramba! faz anooos que não vi algo sobre isso.
lembro que quando criança eu tinha alguns parentes que enfeitavam suas casas com isso.
hoje em dia não vejo nem lugar algum.
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Mensagem por ediv_diVad Ter Mar 29, 2016 10:43 am

Massa pra caramba, lembra a casa dos meus tios em Sorocaba - "Terra Santa", by meu pai.
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Mensagem por Jamm Ter Mar 29, 2016 3:34 pm

show de bola.
aqui tinha essas artê também.

quando li piso no título pensei no Alckimin e o salario dos professores.rsrs
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