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Sob as ordens da Virgem do Rosário, escola primária é destruída a marteladas no México

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Sob as ordens da Virgem do Rosário, escola primária é destruída a marteladas no México Empty Sob as ordens da Virgem do Rosário, escola primária é destruída a marteladas no México

Mensagem por marcelo l. Dom Mar 03, 2013 11:56 am

Em julho do ano retrasado, Nueva Jerusalén, um cidadezinha de cerca de três mil habitantes no estado mexicano de Michoacán, apareceu em todos os noticiários do México. Um grupo do que a mídia chamou de “fanáticos religiosos” destruiu uma escola primária pública a marretadas, aparentemente sob as ordens da Virgem do Rosário (uma aparição da Virgem Maria). Fotos circularam pela internet mostrando homens ferozes, mulheres com longos vestidos e lenços coloridos na cabeça rezando, e uma cidade que parecia um parque temático medieval. De acordo com os artigos que li, os habitantes de Nueva Jerusalén acreditavam que o apocalipse estava próximo e que eles seriam os únicos sobreviventes, e portanto adotaram algumas leis bem estranhas para a vida. Por exemplo, o sexo foi banido já que deve ser feito estritamente para fins de procriação, e com o apocalipse logo na esquina, por que se preocupar em ter bebês? Esses católicos que aparentemente odeiam escolas públicas tinham muitas visões com a Virgem Maria. Quanto mais líamos sobre o lugar, mais perguntas surgiam na nossa cabeça, então decidimos ir até lá.

Planejamos nossa visita para coincidir com o dia 7 de outubro, quando Nueva Jerusalén celebraria o 39º aniversário da visão da Virgem do Rosário que resultou na fundação da cidade, e viajamos por sete horas da Cidade do México até um portão vermelho trancado no final de uma pequena estrada cercada por campos de cana-de-açúcar.

Oito ônibus enormes esperavam do lado de fora, cheios de peregrinos do país inteiro que vieram para a celebração. No portão havia um aviso: “Atenção: é proibida a entrada de mulheres de minissaia, roupas decotadas e camisas sem mangas. Mulheres usando calça, maquiagem, esmalte de unha ou sem lenço na cabeça também são proibidas de entrar. Homens de cabelo comprido ou vestidos de maneira desonesta não serão permitidos”. Nunca entendemos exatamente o que queria dizer “vestir-se desonestamente”, mas sabíamos dessas regras antes e fizemos o melhor possível para segui-las. Eunice e Laura levaram longas saias floridas e lenços que as deixaram parecendo uma mistura de hippies e menonitas, e o Bernardo usou uma camisa de manga longa mesmo com o clima insuportavelmente quente.

Próximo ao portão, cinco policiais federais montavam guarda no topo de uma picape com metralhadoras, uma lembrança da tensão entre os dois grupos que dominam a cidade. Enquanto Nueva Jerusalén é o lar de uma seita ultrarreligiosa que não tolera ser contrariada, dissidentes que não seguem as regras vivem nos limites da cidade — foi esse segundo grupo que pediu para que houvesse uma escola pública na cidade. Depois da destruição da escola no dia 6 de julho, a polícia foi enviada por Fausto Vallejo, governador de Michoacán, para prevenir mais tentativas de violência.

Apesar da imposição do portão trancado, é possível dirigir por mais dois quarteirões e desviar da entrada principal para entrar direto no coração da cidade. Estacionamos na Avenida do Rosário, a principal via de Nueva Jerusalén, e saímos andando, nos misturando à multidão de peregrinos de fora da cidade que vieram para o festival. A cidade é pequena, mas cheia de monumentos religiosos — uma gigantesca torre branca, uma igreja com grandes vitrais azuis, uma enorme estátua do arcanjo Gabriel segurando uma espada que guarda o portão.

Mas o lugar mais sagrado de Nueva Jerusalén é La Ermita (“O Retiro”), um complexo contendo um agrupamento de igrejas e capelas construídas pela metade, uma série de estátuas e um seminário. Quando chegamos, um padre fez questão de nos mostrar tudo, mas não nos deixou tirar nenhuma foto (nosso pedido de levar câmeras para dentro do retiro foi negado antes mesmo da gente chegar lá, disseram que a Virgem não queria que filmássemos os terrenos de La Ermita). Passamos por dezenas de mulheres entoando cânticos para a Virgem e entramos na pequena capela onde o padre nos mostrou uma estátua de mármore de um homem de óculos. “O corpo do Padre Nabor está enterrado aqui”, ele disse, se referindo ao falecido líder espiritual da cidade. Depois apontou para uma pequena pintura na parede e disse que era a imagem original da Virgem, aquela que havia levado à criação da cidade. Ele explicou, empolgado, como a Virgem tinha aparecido há 39 anos para uma mulher humilde chamada Gavina Romero — agora conhecida pelos residentes como Madre Salomé — numa colina perto de onde a cidade fica agora. A Virgem pediu a Gavina para retornar depois e trazer um pedaço de tecido branco. Assim ela fez e, de acordo com o padre, “[a Virgem] imprimiu a imagem dela própria no tecido como numa fotografia instantânea”. A imagem nos pareceu um retrato pintado à mão feito por um artista não muito talentoso, e a história era curiosamente parecida com a da Virgem de Guadalupe, cuja imagem apareceu milagrosamente no tecido da roupa de um camponês chamado Juan Diego depois que ele a viu numa colina da Cidade do México em 1531. Mas, verdade ou não, a história resultou na criação de uma comunidade que tem sobrevivido há décadas.

Margarita Warnholtz é uma etnóloga que passou muito tempo em Nueva Jerusalén entre 1983 e 1988 escrevendo uma tese sobre a história da cidade. Quando falamos com ela, logo antes da nossa viagem, ela nos contou que, quando foi até lá a primeira vez, um dos membros da seita disse que a Virgem a tinha acusado de ser uma espiã, o que a levou a ser expulsa. Alguns meses depois, quando fez amizade com os padres, ela retornou à cidade e a Virgem mudou de ideia, escolhendo Margarita para contar ao mundo a história de Nueva Jerusalén. Ela voltou para lá várias vezes depois e nunca mais teve problema com a seita.

Margarita nos explicou que, em 1973, depois de se manifestar no tecido da Madre Salomé, a Virgem pediu que se construísse um santuário naquele ponto, onde os escolhidos poderiam se reunir e ser salvos do fim do mundo. A Virgem disse a Salomé para procurar por Nabor Cárdenas, que na época era padre numa vila próxima de onde ela vivia, e dizer que ele havia sido escolhido para liderar as pessoas escolhidas para a salvação. A história sobre a aparição da Virgem se espalhou rapidamente e devotos mexicanos de todas as partes do país se mudaram para a área. Assim nascia Nueva Jerusalén.

Carismático e de temperamento forte, Padre Nabor era o líder absoluto da comunidade, comandando tudo através de uma sucessão de procurações supostamente comunicadas pela Virgem do Rosário. Primeiro ela aparecia para Madre Salomé e se comunicava com Nabor através dela, e muitas das mensagens da Virgem eram impressas e distribuídas pela cidade. Algumas eram regras sobre moralidade e conduta pessoal, mas a Virgem também controlava assuntos que normalmente seriam da alçada do prefeito e da prefeitura, como construção de estradas e abertura de poços.

Em 1981, quando Madre Salomé faleceu, duas novas profetas foram escolhidas para transmitir as mensagens da Virgem: Madre Margarita e Madre María de Jesús. Madre Margarita tinha o apoio de muitos comerciantes, que enriqueciam e se tornavam influentes na comunidade, já Padre Nabor favoreceu María de Jesús. A comunidade se dividiu pela primeira vez e, eventualmente, Madre Margarita e aqueles que a apoiavam foram expulsos da cidade. María era um tipo de conduíte diferente de Salomé — ao invés de passar as mensagens da Virgem em segunda mão, ela aparentemente era possuída e falava em audiências como se fosse a própria Virgem, frequentemente entortando o corpo e mudando de voz. De vez em quando ela também era possuída por outros personagens, como a Virgem de Guadalupe, a Virgem de San Juan de Los Lagos, sua predecessora Madre Salomé e uma boneca chamada Yoli, que falava com crianças com uma voz aguda.

Madre María saiu da comunidade em 1990, supostamente seguindo ordens da própria Virgem, e nunca mais foi vista. Agapito Gómez, um associado de longa data de Nabor, se tornou o novo profeta. Agapito falava com a Virgem através de um grupo de intermediários conhecidos como os bem-aventurados, que podiam ser tanto pessoas que viveram e morreram em Nueva Jerusalén e que agora estavam no pós-vida, quanto figuras históricas como Lazaro Cárdenas, ex-presidente do México (Lazaro contatava Agapito diretamente do céu e dizia em quem as pessoas de Nueva Jerusalén deviam votar).

De acordo com muitas pessoas da cidade, Agapito era uma figura sombria e controversa — ele foi acusado de fazer sexo com freiras e de beber, e até passou algum tempo atrás das grades sob a acusação de ter estuprado uma menina menor de idade (ele foi libertado depois de pagar uma fiança). Ele também viajava com um esquadrão de homens armados que chamava de Guarda de Jesus e Maria. Quando o Padre Nabor ficou senil, Agapito foi acumulando cada vez mais poder, mas sua legitimidade foi questionada, em 2006, por alguns residentes, um grupo de sacerdotes que foram excomungados depois de discordarem da decisão dele de construir uma nova igreja nos arredores da cidade. Esses sacerdotes foram seguidos por dezenas de famílias. Esse grupo dissidente ainda acreditava nas aparições da Virgem e na Madre Salomé, mas não considerava que Agapito tivesse a mesma divindade — essas são as pessoas que estão em conflito com a igreja oficial hoje.

Nabor morreu em 2008 aos 101 anos, Agapito morreu alguns meses depois. Hoje o poder da cidade está concentrado nas mãos do sucessor de Nabor, Martin de Tours (um bispo de longa data da igreja), e de Cruz Cárdenas, que atua como prefeita da cidade. Apesar de seus líderes espirituais terem partido, os residentes ainda acreditam na premissa original da cidade — de que ela será o único lugar na Terra que sobreviverá ao apocalipse. Isso mesmo com as datas que Nabor anunciou para o final do mundo viverem mudando. Primeiro o final estava marcado para 1980, depois para 1988, e finalmente para 2000; depois disso ele desistiu de fornecer um calendário específico. Nabor explicou as falhas nas previsões afirmando que seus seguidores ficavam rezando para que o mundo durasse um pouco mais. Se isso é verdade, Nueva Jerusalén é um lugar muito importante mesmo.

Caminhando pela La Ermita com o padre, ficou claro que a ideia de ser o povo escolhido está profundamente enraizada na cultura da cidade. Vimos um mural incrível retratando o apocalipse, no qual uma grande multidão de condenados, incluindo atletas (a Virgem não gosta de esportes, que são proibidos em Nueva Jerusalén) e uma banda de rock (cuja música é igualmente proibida), anda em direção à boca de um enorme demônio. Ao fundo, uma grande cidade que lembra Nova York aparece em chamas e, no canto superior esquerdo, um ponto de luz azul ilumina uma pequena vila no céu — Nueva Jerusalén, obviamente.

No muro exterior de La Ermita está pendurado um enorme cartaz com todas as regras que os habitantes de Nueva Jerusalén têm que seguir. Por exemplo, todo mundo tem que ir à missa pelo menos uma vez por dia e fazer parte dos turnos dos cânticos à Virgem no retiro (os cantos acontecem 24 horas por dia, sete dias por semana). Não é permitido namorar e, claro, casais não podem viver juntos antes do casamento. A desobediência geralmente é punida com multas: não ir à missa custa 12 pesos, e quem for pego tendo um relacionamento amoroso pode ter que desembolsar até 38 pesos.

Em teoria, rádio, TV e internet são proibidos, mas muitas mulheres assistem novela nas televisões de suas casas e essa é uma desobediência semiaberta. Uma loja do outro lado de La Ermita vende uma coleção de DVDs gravados do Padre Nabor discursando e comemorando seu aniversário, bem como de seu funeral e até algumas encenações caseiras impressionantes da aparição da Virgem para Madre Salomé. Compramos todos os que pudemos.

Há poucas lojas na parte religiosa da cidade, e a maioria vende as mesmas coisas: comida, lenços, imagens da Virgem e fotos vagamente assustadoras de Nabor. Todas elas mostram a mesma disposição das imagens de Nabor, de Salomé e dos outros profetas. No pé do quadro está a promessa de acreditar nos “três estágios” — o primeiro sendo os tempos de Madre Salomé, o segundo sendo os tempos de Madre María de Jesús e o terceiro sendo os anos de Agapito. Essa promessa também é a primeira regra escrita no cartaz do lado de fora de La Ermita. Acreditar na divindade dos profetas de Nueva Jerusalén é obrigatório para quem quer morar na cidade.

As pessoas nos arredores da cidade, no entanto, não acreditam nos três estágios — pelo menos não no terceiro — e, mesmo sendo difícil conseguir que alguns de seus líderes religiosos falem com pessoas de fora, os dissidentes estavam ansiosos para conversar com qualquer um sobre como a seita foi má e como é importante reconstruir a escola pública que ela destruiu. Combinamos de nos encontrar com alguns deles, e ficamos um pouco surpresos quando o cara que ia nos levar para encontrar os dissidentes apareceu fedendo a álcool e quase não conseguindo andar, já que bebidas alcoólicas são proibidas na cidade.

Ele nos levou para um galpão nos limites da cidade onde fomos recebidos por Emiliano, um homem grande que nos contou que era ateu (uma raridade em Nueva Jerusalén, mesmo entre os dissidentes) e que aquele era um tipo de centro de reabilitação para pessoas viciadas em religião. Dentro, as paredes foram pintadas à mão com o que parecia ser uma paisagem bíblica e algumas colunas de isopor estavam num canto. Seis pessoas estavam sentadas nas cadeiras de plástico assistindo um vídeo projetado num lençol branco pendurado na parede. O vídeo começava com uma animação gráfica apresentando chamas infernais e as palavras “NUEVA JERUSALÉN SOB ATAQUE”, e consistia principalmente da apresentadora queimando os três padres da cidade e gritando com eles por terem destruído a escola e por serem fanáticos religiosos. O pequeno público no galpão aplaudiu em silêncio. Na tela, os padres faziam o melhor para justificar suas ações e falavam sobre a Virgem, mas ficava óbvio que o vídeo não estava do lado deles. Se isso estava causando alguma impressão nos “viciados” do galpão, era algo mais incerto.

No dia da celebração da aparição da Virgem, chegamos à igreja dos dissidentes enquanto eles se preparavam para as festividades. O lugar de adoração deles era muito mais modesto que La Ermita. Algumas partes ainda estavam por terminar, mas tudo estava muito bem decorado com bandeiras e fitas azuis e brancas. Incenso e fumaça subiam pelo prédio de concreto sem pintura, fazendo com que ele parecesse quase misterioso. As mulheres aqui se vestiam da mesma maneira que as mulheres da parte religiosa da cidade, todas de lenço na cabeça e saias longas. Os homens também estavam vestidos de maneira bem “decente”. A igreja estava lotada e a cerimônia começou dramaticamente quando o prefeito Santiago, o líder dos dissidentes, emergiu da fumaça ladeado por dois outros sacerdotes. Eles realizaram o rito em latim, de costas para o público — foi uma missa tridentina, uma forma de cerimônia que data de antes das reformas adotadas pela Igreja Católica nos anos 1960 depois do Segundo Conselho do Vaticano. Como alguns católicos ao redor do mundo, tanto os dissidentes quanto as pessoas mais religiosas de Nueva Jerusalén acham que a igreja saiu do caminho depois do Concílio Vaticano II e não reconhecem a autoridade do Papa atual.

A cerimônia durou em torno de duas horas, com muitos cânticos, rezas e leituras de passagens da Bíblia e das mensagens da Virgem comunicadas pela Madre Salomé. Depois de tudo, fomos convidados para almoçar com o resto da comunidade num terreno baldio próximo à igreja. O clima era festivo: havia música, doces eram distribuídos entre as crianças e duas garotas realizaram uma dança típica. Conhecemos o Oscar, um cara eloquente e esperto de vinte e poucos anos nascido em Nueva Jerusalén e que se apresentou como o líder jovens dos dissidentes. Ele nos levou para um passeio pelo lado dele da cidade e nos contou a história de como seus pais largaram tudo para se mudar para Nueva Jerusalén nos anos 1980, atraídos pela promessa de sobreviver ao apocalipse. Ele é parte da segunda geração de Nueva Jerusalén, aqueles que não escolheram nascer num ramo ultraconservador e apocalíptico da Igreja Católica e que não estão particularmente felizes com os padres controlando tudo o que eles fazem, vestem ou bebem.

ndamos com o Oscar pelo centro da cidade até a agora infame escola. Algumas pessoas gritaram com a gente por estarmos andando com os dissidentes. O clima continua tenso, principalmente graças à luta por educação. Por anos, a única escola de Nueva Jerusalén foi controlada pelos padres, que naturalmente ensinavam um currículo bem restrito. Então os dissidentes pediram que o governo construísse uma escola pública que qualquer pessoa pudesse frequentar, mas mesmo esse simples pedido enfureceu tanto a comunidade religiosa, que eles atacaram a escola nas primeiras horas da manhã, destruindo seis salas de aula com marretas e queimando totalmente outro prédio.

Oscar foi o único a documentar esse ato violento — depois de receber um telefonema avisando do ataque às cinco da manhã, ele correu para a escola com uma câmera e filmou a devastação. Seus vídeos e fotos foram publicados por quase todos os meios de comunicação do México.

Apesar de afirmarem que não ordenaram a destruição da escola, os padres depois justificaram a ação em entrevistas para a imprensa. Padre Luis, um dos principais sacerdotes da igreja, disse à CNN que “o que aconteceu é que [os dissidentes] queriam usar a escola como maneira de proteger a si mesmos, e como maneira de introduzir na cidade tudo que é proibido aqui, como moda, imoralidade, vícios, drogas e álcool”. E apenas duas semanas depois de negar nosso pedido para filmar La Ermita, Cruz Cárdenas, a maior autoridade civil da cidade e braço direito do líder Martin de Tours, foi presa por suspeita de ter participado da destruição da escola.

Parece que depois de décadas deixando a cidade se governar sozinha, as autoridades finalmente prestaram atenção em Nueva Jerusalén, como indicam a construção da escola e a presença de policiais armados. Tradicionalmente, Nueva Jerusalén sempre votou em massa no PRI, o partido político do governador Vallejo, mas agora parece que os dissidentes estão se alinhando ao partido de esquerda PRD, complicando um pouco a questão. Para satisfazer as demandas dos dissidentes na esteira da destruição da escola, o governo do estado construiu uma escola primária provisória na cidade mais próxima, que, quando visitamos, estava protegida por um esquadrão de policiais federais armados com metralhadoras e usando coletes à prova de balas.

Nas ruínas da escola, Oscar nos contou que acreditava que “o caminho da liberdade é educar as pessoas, e o caminho da escravidão é manter as pessoas na ignorância”. As taxas de alfabetização na região são alarmantemente baixas, e o acesso à mídia parece bem restrito. De muitas maneiras, Nueva Jerusalén lembra uma cidade transplantada de um tempo antigo, quando as pessoas acreditavam honestamente em milagres e faziam justiça com as próprias mãos.

Margarita, a etnologista que voltou à cidade algumas vezes depois do incidente na escola, acredita que os problemas da comunidade vão bem além da disputa atual entre os dissidentes e os ultrarreligiosos. Ela está preocupada com as consequências da profunda divisão que já dura sete anos, com os 40 anos em que a comunidade educou seus próprios filhos e com a falta de uma liderança forte atualmente. Ela teme que, se as autoridades agirem sem cuidado o suficiente, a seita pode acabar num cenário Jonestown, onde cometam suicídio em massa ou usem de violência contra eles mesmos ou contra os dissidentes porque acreditam que suas crenças estejam sob ataque. As autoridades estaduais reconheceram publicamente que a prisão de Cruz Cárdenas pode resultar em mais conflitos entre os dois lados da cidade, por isso a presença de policiais armados. Os dissidentes também começaram a realizar rondas noturnas para sua própria segurança.

Voltamos com o Oscar para a igreja dos dissidentes e descobrimos que estávamos com um pneu furado. Não pudemos evitar fazer piada dizendo que talvez a Virgem não estivesse contente com a nossa presença. Antes de partirmos, conversamos com algumas garotas de saias justas e lenços azuis na cabeça sobre suas vidas. Elas pareciam felizes, porém frustradas com tudo o que estava acontecendo. Uma delas disse: “As pessoas religiosas querem encher o céu de gente ignorante e mandar as pessoas sábias para o inferno. É por isso que elas não querem que as pessoas estudem. Mas nós queremos estudar”.

Enquanto trocávamos o pneu, uma adolescente chamada Socorro se aproximou e disse: “Eles ficam dizendo que o fim do mundo está próximo e que por causa disso todos temos que rezar. No começo, quando eles convenceram as pessoas a virem morar aqui, eles disseram que nesta cidade o mundo não ia acabar. Que só acabaria fora daqui. Acho que o mundo não vai acabar. A única coisa que vai acabar somos nós”.

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Mensagem por marcelo l. Dom Mar 03, 2013 11:58 am

Bom artigo da vice para variar, vale a pena ir no site deles por causa das fotos do local.
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Mensagem por zkrk Dom Mar 03, 2013 10:38 pm

A prióri, acho que uma solução pacífica seria que Nueva Jerusalém recebesse o mesmo status e o mesmo tratamento que o "País amish" (Amish Country) recebe nos EUA, já que inclusive podem ser traçadas algumas similaridades entre os dois grupos.
Os dissidentes de Nueva Jerusalém poderiam ser realocados na cidade próxima onde a escola primária foi construída, devendo a cidade de Nueva Jerusalém pagar os custos do translado e a indenização pelas casas, lojas, plantações e negócios dos dissidentes.
No mais em troca de uma autonomia administrativa, Nueva Jerusalém poderia ter que aceitar que os jovens que nascessem na cidade tivessem direito a algo como o "rumspringa" dos amish, além de que se a cidade se nega a ter escolas públicas, etc, então os moradores de Nueva jerusalém também deveriam abrir mão de participar de eleições estaduais e nacionais, ficando restrios a eleições municipais, da própria Nueva Jerusalém.
Auxílio médico ou socorro governamental (em caso de desastre natural, por exemplo) continuariam valendo da parte do governo federal mexicano para com a cidade, assim como por parte do governo estadual. Se a cidade se negasse a receber, os dirigentes de Nueva Jerusalém deveriam ou fazer um plebiscito público consultando a população sobre receber ou não o auxílio ou então em nome da cidade assinar uma declaração dispensando o auxílio e eximindo o governo de qualquer problema posterior. Qualquer morador que quisesse receber ajuda poderia fazê-lo em uma cidade próxima, como cidadão mexicano.

Comunidades fundamentalistas e tradicionalistas existem em razoável quantidade, podendo tanto ser de vertentes protestantes (como os Amish dos EUA) quanto católica (como Nueva Jerusalém). O lance das roupas me lembrou as exigências dos judeus ortodoxos para a entrada em algumas áreas de Jerusalém... uma professora minha comentou inclusive que um repórter quase foi apedrejado por um judeu ortodoxo por estar usando uma camisa "indecorosa" (uma blusa social rosa claro.com as mangas dobradas até os cotovelos devido ao calor do Oriente Médio).
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Mensagem por zkrk Dom Mar 03, 2013 10:38 pm

marcelo l. escreveu:Bom artigo da vice para variar, vale a pena ir no site deles por causa das fotos do local.

Não conhecia esse site. Me indica mais quais reportagens deles?
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Mensagem por Goris Dom Mar 03, 2013 11:42 pm

Ignorância e brutalidade.

Vivo num mundo tão diferente desse que me pergunto como as pessoas podem viver assim...
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Mensagem por marcelo l. Seg Mar 04, 2013 5:23 pm

zkrk escreveu:
marcelo l. escreveu:Bom artigo da vice para variar, vale a pena ir no site deles por causa das fotos do local.

Não conhecia esse site. Me indica mais quais reportagens deles?

Bom pelo meu gosto a vice tem muita coisa que um pulo, a parte de sexo deles por exemplo, mas de uma reportagem eu começaria com a floresta do suicídio que é um documentário sobre um tema que tem até a Hq sobre, do resto como todo site tem que garimpar para ver o que a pessoa gosta, mas normalmente as reportagens sobre Japão são daquele jeito, México desse mesmo quando feito por pessoas diferentes.



Goris escreveu:Ignorância e brutalidade.

Vivo num mundo tão diferente desse que me pergunto como as pessoas podem viver assim...

No Brasil depois do fenômeno da Teologia da Libertação, o lado sobrenatural perdeu muito na linguagem entre religião e movimentos populares, e foi muito combatido como um erro, uma alienação, como gosta o Boff, mas antes teve muitos casos idênticos no Brasil desse aí.

Desde os anos 1970, ocorre no Brasil são algumas "religiões alternativas" com viés da nova era que vivem em comunidades fechadas que mesmo nelas já perdeu-se o impeto inicial.


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Mensagem por ediv_diVad Seg Mar 04, 2013 5:31 pm

Realmente esse VICE tem matérias muito bacanas, valeu a dica.

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