Dica de livro - O Nome do Vento
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Dica de livro - O Nome do Vento
Lançamento antigo, mas que só vim perceber a qualidade por agora. Talvez por sua capa ser comum, eu o julguei como sendo um romance épico clichê. Não podia estar mais enganado. O autor do romance até em entrevista comentou que sua meta era fugir das fórmulas prontas. E conseguiu. Nessa história você não verá um vilão imperador que quer dominar o mundo, nem um herói sem defeitos. Kvothe, o personagem principal, apesar de não ser aquele paladino clássico, também não cai no exato oposto que de tão recorrente se tornou também um clichê, o anti-herói. Em um mundo de fantasia, o autor contou um enredo com elementos de realidade. Algo que irei explicar a seguir.
Kvothe vive como um hospedeiro, dono de hospedaria, mas sua vida é só um disfarce. Um cronista a paisana o reconhece como sendo uma personalidade famosa realizadora de grandes feitos e propõe a ele ser feita uma crônica sobre sua história de vida. Kvothe então pede ao cronista três dias. Cada livro da trilogia é um dia de entrevista. As partes no presente são em terceira pessoa. As partes do passado, a qual é Kvothe contando ao cronista sua vida, são em primeira pessoa.
O mundo da trilogia As Crônicas do Matador do Rei é um mundo medieval bem tipico de RPGs, porém aqui as criaturas clássicas foram substituídas. Não há elfos ou orcs. Em seu lugar há os fae. Criaturas folclóricas mais ligadas a cultura celta. No mundo do romance a magia não é tão bem definida. Mais ou menos como em Game of Thrones. Os faes também não são de conhecimento geral, são seres misteriosos que muitos atribuem serem demônios. Falando em capeta, a religião predominante nesse universo não é o cristianismo, mas sim uma outra que funciona quase como sendo uma critica a esta, o tehlurianismo. Assim como o cristianismo, em tempos remotos eles caçavam e queimavam bruxas na fogueira entre outras coisas.
Já que mencionei Game of Thrones cabe fazer uma comparação entre as duas obras. O trabalho de George R.R. Martim é muito mais complexo e rico. O que para muitos pode ser confuso. A história das Crônicas do Matador do Rei é mais simples e tem bem menos personagens envolvidos. O enredo de Game of Thrones força mais o raciocínio do leitor, mas para ser honesto eu achei a saga de Kvothe mais divertida de acompanhar.
Apesar de ser um mundo medieval, há muitas passagens que nos fazem pensar que estamos vivenciando algo contemporâneo. Principalmente ao que diz respeito a parte da Universidade. Kvothe fica órfão após seus pais serem assassinados e vai virar menino de rua. Depois ele consegue alguma verba para ingressar na Universidade, o local onde os arcanistas (versados em magia) estudam. Como um garoto pobre, Kvothe tem que se virar para custear sua formação, mesmo recebendo bolsa. Esse é o problema que ao longo do livro mais atormenta nosso herói. Mas não se assuste, fã de fantasia. As passagens mágicas e épicas tem papel importante aqui, mesmo com esse lado mais pé no chão.
O Nome do Vento, assim como Game of Thrones, é daqueles universos com magia sútil. Ou Low Fantasy. O lado mais interessante desse gênero é que ele consegue que pequenos feitos tomem ares de grandiosos. O problema de obras como Harry Potter é que fazer grandes feitiços é tão banal que perde a intensidade do ato. Já em histórias como a de Kvothe, o leitor é estimulado a se perguntar a todo momento se um acontecimento é ou não mágico. Além de que coisas que em uma saga como Harry Potter a gente nem liga, como empurrar uma pessoa sem tocá-la, aqui se torna o climáx da aventura. Dá para vibrar só pelo personagem ter conseguido fazer coisas que em outros enredos é sem importância. Já que aqui acontecimentos mágicos são valorizados por sua escassez.
Apesar de todas essas características o que me marcou nesse primeiro volume da trilogia foi sua moral da história. Caso você queira descobrir essa moral por si mesmo, lendo o livro, sugiro que pare de ler essa resenha aqui. Caso não se importe em saber esse spoiler, continue a acompanhar o parágrafo seguinte.
“Você será o que acredita ser”. Essa frase já vi em tantos lugares e ela sempre me pareceu boba. Igual aquelas mensagens de autoajuda que lotam o facebook. Mensagens bonitinhas, mas que não querem dizer muita coisa. Isso porque muitas delas carecem de um contexto. Há uma passagem no início do livro em que Kvothe, mesmo ainda na mendicância, é tratado por um lojista como se fosse um filho de um nobre, pois ele estava arrumado e se portava como se realmente fosse rico. Mais tarde, na Universidade, para angariar respeito, Kvothe começa a agir como se fosse destemido, como se fosse um herói. A mentira foi tão boa que todos acreditaram nela, até mesmo ele passou a acreditar nela e a mentira virou verdade. Corta para o presente, Kvothe vive como um hospedeiro para fugir dos inimigos. Como um bom ator ele faz com que todos a sua volta acreditassem que ele era só um dono de bar e isso se torna o maior problema do personagem. Por todos compartilharem aquela crença ele também passou a nutri-la. Resultado: Kvothe perdeu os dons que ganhou na Universidade e começou a acreditar que o seu papel era verdadeiro. Falar simplesmente ”você será o que acredita ser” chega até a soar bobo, mas com seiscentas páginas dando base a essa frase, ela chega até a se tornar genial.
alancosme32- Farrista das "Árvores Somos Nozes"
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Re: Dica de livro - O Nome do Vento
Achei muito bom o seu review. Acho que até tenho esse livro por aqui, vou vê se dou uma lida pra conferir, este ultimo parágrafo me deixou com água na boca
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