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Diretor quer seu filme proibido pirateado

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Diretor quer seu filme proibido pirateado Empty Diretor quer seu filme proibido pirateado

Mensagem por marcelo l. Qui Set 19, 2013 3:44 pm

As luzes se acendem e o nome de Ziad Doueiri aparece na tela. Eu recolho calmamente meus pertences e saio do cinema. Estou enfatizando isso porque “calmo” não é o adjetivo mais comumente usado quando se trata do conflito entre palestinos e israelenses. Essa é a genialidade por trás do filme de Doueiri e o motivo porque quis conversar com ele.

O filme West Beirut de Ziad é o mais belo relato da Guerra Civil Libanesa que já encontrei, então, presumi que ele iria enfrentar The Attack da mesma maneira. O filme acompanha a história do Dr. Amin Ja'afari, um proeminente cirurgião palestino que conseguiu se integrar com sucesso à sociedade israelense, e sua esposa, que se torna mulher-bomba.

O filme tira o foco da narrativa sobre o conflito dos jornalistas, políticos e pacificadores da ONU e o joga sobre as pessoas que lidam com as nuances diárias de viver entre dois estados. A história começa em Tel Aviv, com Amin Ja'afari recebendo um prêmio entre seus colegas israelenses. O público vê um pouco de seu cotidiano: Amin faz suas rondas diárias, almoça com outros médicos e parece levar uma vida mundana. Amin é apresentado como um indivíduo antes das circunstâncias que o transformarão no palestino viúvo de uma terrorista suicida.

Ziad sustenta a narrativa com a busca de Amin pela verdade, seu deslocamento entre os dois estados e a luta para tentar entender como qualquer pessoa — principalmente a mulher que foi sua esposa durante 15 anos — pode cometer um ato desse tipo. As pessoas se identificam com o protagonista e quase sentem empatia pelos antagonistas. Ziad desenha detalhes individuais da vida em Israel e na Palestina, e, mais importante, mostra tudo o que está no meio disso.

Ziad pula a influência política em torno do conflito e apresenta uma história humana. A reação ao filme no Ocidente tem sido mais ou menos positiva. A reação no mundo árabe, no entanto, foi cortada depois da decisão da Liga Árabe de proibir o filme. Liguei para o Ziad, na Califórnia, e falei com ele sobre a abordagem “ocidental” à arte árabe, os canais políticos pelos quais ele teve que passar para filmar em Israel e na Palestina e como ele mal pode esperar para que seu filme seja pirateado para o mundo árabe, porque ele quer ouvir o que essas pessoas têm a dizer.

VICE: Você está lidando com um assunto bastante polarizado. Como você conseguiu que as pessoas se concentrassem na dimensão humana do conflito entre árabes e israelenses?
Ziad Doueiri: Você já respondeu sua própria pergunta na verdade. Já sabíamos que o filme seria cheio de tensão quando começamos a escrevê-lo. Não queríamos que fosse uma propaganda de um lado ou um filme que gritasse uma moral. Queríamos que ele fosse visto através dos olhos do personagem principal, um homem que está somente procurando pela verdade. Isso não quer dizer que o filme não vá criar um diálogo. É uma coisa natural. É preciso lidar com isso. Mas não queríamos repetir o que já sabíamos, o que os árabes já sabem, o que os israelenses já sabem, o que os judeus já sabem. Todo mundo sabe! E todos têm alguma posição. Estamos tentando ver o assunto de um ponto de vista diferente e mostrar que todo mundo tem uma perspectiva sobre isso.

Você teve que pedir autorização dos municípios israelenses para filmar em Israel e das autoridades palestinas para filmar na Palestina. Você teve que discutir com eles sobre o assunto do filme? Quão fundo você teve que ir?
Foi um processo bem simples. Na verdade, essa foi a parte fácil. Ninguém pediu para revisar o roteiro, ninguém nos pediu para acatar isso ou aquilo, só pedimos a permissão e conseguimos. Fomos até as autoridades palestinas e me encontrei com o prefeito, conversamos e ele nos pediu para tentar mostrar Nablus não de uma perspectiva negativa, porque ele queria que mais cineastas viessem filmar ali. Eu disse que essa não era a situação, queríamos filmar em Nablus pela autenticidade.

Eu sei que você foi até os escritórios do Hezbollah. Casualmente. Eles queriam falar com você sobre a natureza de seu filme e também sobre você estar filmando em Israel. Como foi esse encontro?
Eles me chamaram para uma reunião com um dos oficiais. Eu estava só imaginando qual seria a posição do partido sobre o fato de o filme ser filmado por um diretor libanês, em Israel e com atores israelenses. Eles deram a opinião deles: não podiam apoiar o filme porque eu tinha filmado — de acordo com eles — na terra de um inimigo direto. Eu disse que era só um filme e que eu tinha que filmar em Israel pela autenticidade, e por isso também tinha que filmar com atores israelenses. Não vou contratar atores egípcios para fazer o papel de israelenses. O filme tinha que ser filmado em hebraico. Ele disse simplesmente: “Olha, entendemos seu processo, mas não vamos dar nosso apoio publicamente. Mas claro, você tem o direito de filmar o que quiser”. Então, a reunião foi diplomática e eu só queria saber o que eles iam fazer quando o filme fosse lançado, mas agora o filme foi proibido no mundo árabe. Logo, essa questão não vai mais surgir.

Entendo. A única decisão unânime que a Liga Árabe já tomou e é sobre um filme.
[Risos] É uma vergonha.

Você teve que entregar o roteiro para as autoridades libaneses antes de filmar no Líbano?
Não, porque não filmei no Líbano. Depois que o filme estava terminado, nós o submetemos ao Raqabah, o Departamento de Censura da Segurança Geral, e eles o aprovaram. Eles disseram que não viram o filme como antipalestino; eles nos deram a permissão para filmar e fiquei muito, muito surpreso. Foi só depois que um comitê libanês, o Comitê de Boicote a Israel, montou uma campanha contra o filme e começou a coisa toda. Eles fizeram lobby para que a Liga Árabe e o governo libanês voltassem atrás, então, o governo libanês aceitou e foi isso.

Há bem pouca cobertura sobre a resposta árabe. Na maioria das vezes, “arte árabe” é vendida como esse produto cultural existencial feito para mudar a percepção sobre o Oriente Médio. Na verdade, estamos somente fazendo arte e não damos a mínima para a “percepção”.
Olha, temos opiniões muito interessantes vindas do mundo árabe e tentando mudar as coisas. Mas, quando se trata de Israel, entre a imprensa ou mesmo entre o braço liberal árabe, a tendência é tudo ser muito preto no branco. Mesmo quando mostro a mais ligeira perspectiva israelense, já é demais. Então, temos um longo caminho pela frente. Quer dizer, os israelenses estão constantemente fazendo filmes muito críticos sobre a instituição deles, eles estão fazendo filmes incrivelmente abertos, ao passo que os árabes não querem ver isso dessa maneira, eles estão presos à sua velha, sua velha...

Mentalidade.
É, mentalidade. O que eles não entendem é que o filme será provavelmente pirateado e as pessoas do mundo árabe vão assisti-lo, no computador ou na TV, pirateado ou não.

Você acha que a proibição será revogada depois que as pessoas assistirem ao filme e derem sua opinião?
Não. Não acho que a proibição será revogada um dia. O assunto Israel é uma linha vermelha no mundo árabe. Mas ainda acho que as pessoas vão acabar assistindo. Para dizer a verdade, eu mesmo considerei piratear o filme e mandar para o Líbano. Até liguei para um amigo e perguntei se ele consideraria piratear o filme. Ele disse “olha, posso te vender 100 cópias por US$100, mas você não vai ver nenhum lucro, não posso garantir que a cópia pirateada que estarei vendendo vai gerar mais 10 mil cópias. Mas se você quiser fazer isso só para foder com o governo libanês, eu faço de muito bom grado”. No final, eu disse que não íamos piratear nada, deixe eles fazerem isso, vai acontecer. Sabe, quando um diretor quer piratear seu próprio filme, isso diz muita coisa sobre a situação toda.

Quanto ao enredo, o casamento do protagonista era uma fraude? Ou a esposa tinha sentimentos por ele?
Não, era para valer. Ela o amava muito, mas também era uma pessoa muito ambígua; ela era muitas coisas. Não estamos mandando uma mensagem, não há uma mensagem em particular, estamos dizendo que ela tinha suas necessidades e que ele não via as necessidades dela. Ela tinha o conflito; seu marido não via o conflito. Ele tinha muito sucesso e estava muito bem integrado. Ele tinha boas intenções, boa vontade; ele não era misterioso, cruel ou manipulador. Ele só estava cego por quem ele era; estava convencido de que criaria esse mundo perfeito num mundo muito imperfeito.

No livro em que o filme foi baseado, Siham — a esposa — é muçulmana, mas você a coloca como cristã no filme. Por quê?
Isso foi um incidente na verdade. Eu estava andando por Nablus e encontrei uma igreja no meio da cidade, e Nablus é uma cidade muito muçulmana. Então, tive uma ideia de fazer ela cristã. O que é inesperado e imprevisível. Então, voltamos e a tornamos cristã. Queríamos enfatizar que a luta entre palestinos e israelenses não é realmente religiosa, como no Iraque ou na Síria, mas uma questão de nacionalidade. É sobre duas pessoas lutando por uma pátria, sobre duas pessoas reivindicando sua própria pátria. Não é uma questão de ser muçulmano ou cristão. E há cristãos no mundo árabe, são pessoas proeminentes, mas ninguém fala sobre elas.

Perto do final do filme, o protagonista vai para Nablus, onde ele se sente alienado, depois volta para Israel, onde ele é — ou era — integrado. Ele está dividido entre dois extremos, cada um pedindo que ele chegue mais perto. É como se a tentativa de alcançar um equilíbrio fosse impossível.
A maioria de nós, que viemos do mundo árabe e vivemos no exterior, ficamos sempre imaginando a que lugar pertencemos, onde nos encaixamos melhor. Quando vou para o mundo árabe, sinto que pertenço, mas não me encaixo. Agora que vivo nos Estados Unidos, entre os Estados Unidos e Paris, sinto que me encaixo, mas que não pertenço. É uma busca sem fim. Estou constantemente jogando com essas ideias. Onde quero ser enterrado, onde quero soltar minha âncora e me estabelecer, mas nunca tenho a resposta. Com Amin Ja'afari é a mesma coisa, sabe. Ele é pego entre um mundo e outro.

Isso, com certeza, vai ecoar profundamente em muitos árabes em diáspora.
É o meu caso. Eu me interesso mais pelo que diz respeito à pessoa do que sobre um coletivo.

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