Polarização política nos EUA obriga empresas a tomarem partido
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Polarização política nos EUA obriga empresas a tomarem partido
Antonia Laborde
Washington 20 JUL 2018 - 08:47 BRT
As empresas dos Estados Unidos não oferecem mais apenas um serviço, e sim, também, uma postura frente a temas sociais candentes. A American Airlines pediu ao Governo que não utilizasse seus aviões para transportar crianças imigrantes separadas de seus pais, a consultoria McKinsey & Company anunciou que deixará de trabalhar com a agência de imigração dos EUA, a rede de varejo Walmart aumentou a idade para a compra de armas, e a locadora de veículos Hertz eliminou o desconto dado aos membros da Associação Nacional do Rifle. Assim como elas, dezenas de empresas estão confrontando Donald Trump nos últimos meses. Os especialistas atribuem essa tendência à polarização política no país e à relevância que os millennials dão aos valores da empresa para a qual trabalham, e se os produtos que consomem são coerentes com seus princípios.
A política de “tolerância zero” aplicada às famílias de imigrantes recém-chegados em situação irregular é um dos exemplos mais visíveis do novo rumo ativista que as empresas estão tomando. Quatro companhias aéreas - American Airlines, United Airlines, Frontier Airlines e Southwest Airlines - publicaram comunicados em que solicitavam ao Governo que não utilizasse seus serviços para transportar crianças separadas de seus pais indocumentados. As quatro compartilhavam o discurso de que sua missão era unir seres queridos, e que a medida de Trump entrava em sério conflito com seus valores.
Antes que o mandatário norte-americano recuasse, os diretores da Apple, do Uber e do Airbnb qualificaram a prática de "desumana" e "imoral". Para algumas empresas tecnológicas, não foi tão fácil. No começo do ano, a Microsoft publicou que estava “orgulhosa de apoiar” através de seus produtos o Serviço de Imigração e Alfândegas dos Estados Unidos (ICE, na sigla em inglês). O gigante tecnológico afirmava que suas ferramentas permitiam “acelerar o reconhecimento facial e a identificação" dos imigrantes. Depois do recrudescimento da vigilância fronteiriça e diante das críticas nas redes sociais, a empresa apagou algumas frases do post e insistiu para que Administração altere sua política. O presidente da companhia, Brad Smith, encerrou o assunto na sexta-feira passada. Retificou o discurso anterior dizendo que seu produto “não é usado em absoluto para o reconhecimento facial”, ao contrário do que dizia o blog em janeiro.
Na semana passada, a destacada consultoria de gestão McKinsey & Company anunciou que deixará de trabalhar para o ICE, atendendo a queixas dos seus funcionários. Na Deloitte, corre um abaixo-assinado pedindo aos executivos que encerrem as consultorias prestadas à agência devido a “objeções morais”. Daniel Korschun, professor associado de marketing da Universidade Drexel e pesquisador do ativismo corporativo, afirma que o desafio para as companhias consiste em buscar um equilíbrio entre os valores que professa e o seu comportamento. “Em uma de minhas pesquisas, aparecia que os consumidores são capazes de abandonar uma companhia se ela não tomar partido, especialmente se ela defende publicamente certos valores. Consideram-na hipócrita se não agir assim”, afirma.
Korschun atribui às redes sociais e aos millennials a crescente pressão sobre as empresas para que se pronunciem, já que para esse público não interessa apenas o produto, mas também as atitudes da companhia. Brayden King, professor associado da Escola de Administração Kellogg, na Universidade Northwestern, considera que o papel dos jovens na tomada de decisões políticas das empresas tem relação com o interesse das corporações em atraí-los como empregadores: “Eles não querem vender coisas em que não acreditam, por isso muitas companhias tomam partido e competem para serem escolhidas como seu local de trabalho”.
Depois do massacre de Parkland, na Flórida, onde um aluno matou 17 pessoas, as redes Walmart, Dick’s Sporting Goods e Kroger elevaram de 18 para 21 anos a idade mínima para comprar uma arma. Empresas como Hertz, MetLife e Best Western suspenderam sua política de descontos para membros da Associação Nacional do Rifle (NRA, na sigla em inglês). A companhia aérea Delta cancelou um desconto de viagem para os filiados à NRA, o que levou legisladores republicanos da Geórgia a retaliarem revogando uma isenção de impostos sobre combustíveis equivalente a 50 milhões de dólares (191,5 milhões de reais). “Quando as companhias tomam partido devem fazê-lo de maneira multidirecional. Não podem pensar somente em seus clientes, também precisam considerar seus investidores e empregadores. Todos são importantes”, diz King. “Os executivos têm que ouvi-los mais”, acrescenta Korschun.
Segundo as pesquisas do professor da Drexel, os clientes preferem que as companhias tomem partido mesmo quando não se alinham com suas posturas. Valorizam a transparência acima da zona cinzenta. “Ainda há uma percepção de que se envolver é negativo. Isto porque o risco é supervalorizado, e deixar de assumi-lo é algo subestimado”, explica. King desconhece essa premissa, e defende que 90% dos clientes não sabem que lado defende a companhia da qual está comprando, e que muitas professam uma coisa e fazem outra. Ele salienta que tudo depende do ramo de atividade da companhia, e cita como exemplo a Patagonia, marca de roupa esportiva sustentável. “É normal que nesse caso os consumidores esperem que a empresa respeite o meio ambiente”.
O veto fronteiriço dos Estados Unidos aos imigrantes de sete países de maioria muçulmana irritou muitas empresas tecnológicas. Google, Facebook, Twitter e Uber expressaram seu descontentamento argumentando que a medida afeta muitos de seus empregados e poderia repercutir negativamente em seus negócios. “O perigo do ativismo corporativo é quando as empresas procuram manipular os clientes. O mesmo vale para os empregados. O chefe não pode obrigar seus trabalhadores a irem a campanhas ou doarem dinheiro para suas causas pessoais”, observa Korschun. King esclarece que não há como saber se estamos sendo manipulados, mas diz que os clientes mais sérios podem fazer a tarefa de revisar o histórico das empresas, ver a quem fizeram doações e quais certificados possuem.
O ativismo corporativo não nasceu com Trump. Nos anos sessenta, o supermercado Woolworth, na Carolina do Norte, tentou proibir a entrada de afro-americanos em suas lojas, quando o movimento dos direitos civis já havia atingido seu ponto de inflexão. A Disney também protagonizou um caso muito divulgado em 1996, quando apoiou os direitos dos homossexuais celebrando o Dia Gay. O que é fato é que há cada vez mais pressão sobre as empresas e, portanto, são cada vez mais as que aderem. “Essa reviravolta é inevitável, as companhias que não estão fazendo isso estão demorando, porque agora é assim que o negócio funciona”, conclui Korschun.
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Washington 20 JUL 2018 - 08:47 BRT
As empresas dos Estados Unidos não oferecem mais apenas um serviço, e sim, também, uma postura frente a temas sociais candentes. A American Airlines pediu ao Governo que não utilizasse seus aviões para transportar crianças imigrantes separadas de seus pais, a consultoria McKinsey & Company anunciou que deixará de trabalhar com a agência de imigração dos EUA, a rede de varejo Walmart aumentou a idade para a compra de armas, e a locadora de veículos Hertz eliminou o desconto dado aos membros da Associação Nacional do Rifle. Assim como elas, dezenas de empresas estão confrontando Donald Trump nos últimos meses. Os especialistas atribuem essa tendência à polarização política no país e à relevância que os millennials dão aos valores da empresa para a qual trabalham, e se os produtos que consomem são coerentes com seus princípios.
A política de “tolerância zero” aplicada às famílias de imigrantes recém-chegados em situação irregular é um dos exemplos mais visíveis do novo rumo ativista que as empresas estão tomando. Quatro companhias aéreas - American Airlines, United Airlines, Frontier Airlines e Southwest Airlines - publicaram comunicados em que solicitavam ao Governo que não utilizasse seus serviços para transportar crianças separadas de seus pais indocumentados. As quatro compartilhavam o discurso de que sua missão era unir seres queridos, e que a medida de Trump entrava em sério conflito com seus valores.
Antes que o mandatário norte-americano recuasse, os diretores da Apple, do Uber e do Airbnb qualificaram a prática de "desumana" e "imoral". Para algumas empresas tecnológicas, não foi tão fácil. No começo do ano, a Microsoft publicou que estava “orgulhosa de apoiar” através de seus produtos o Serviço de Imigração e Alfândegas dos Estados Unidos (ICE, na sigla em inglês). O gigante tecnológico afirmava que suas ferramentas permitiam “acelerar o reconhecimento facial e a identificação" dos imigrantes. Depois do recrudescimento da vigilância fronteiriça e diante das críticas nas redes sociais, a empresa apagou algumas frases do post e insistiu para que Administração altere sua política. O presidente da companhia, Brad Smith, encerrou o assunto na sexta-feira passada. Retificou o discurso anterior dizendo que seu produto “não é usado em absoluto para o reconhecimento facial”, ao contrário do que dizia o blog em janeiro.
Na semana passada, a destacada consultoria de gestão McKinsey & Company anunciou que deixará de trabalhar para o ICE, atendendo a queixas dos seus funcionários. Na Deloitte, corre um abaixo-assinado pedindo aos executivos que encerrem as consultorias prestadas à agência devido a “objeções morais”. Daniel Korschun, professor associado de marketing da Universidade Drexel e pesquisador do ativismo corporativo, afirma que o desafio para as companhias consiste em buscar um equilíbrio entre os valores que professa e o seu comportamento. “Em uma de minhas pesquisas, aparecia que os consumidores são capazes de abandonar uma companhia se ela não tomar partido, especialmente se ela defende publicamente certos valores. Consideram-na hipócrita se não agir assim”, afirma.
Korschun atribui às redes sociais e aos millennials a crescente pressão sobre as empresas para que se pronunciem, já que para esse público não interessa apenas o produto, mas também as atitudes da companhia. Brayden King, professor associado da Escola de Administração Kellogg, na Universidade Northwestern, considera que o papel dos jovens na tomada de decisões políticas das empresas tem relação com o interesse das corporações em atraí-los como empregadores: “Eles não querem vender coisas em que não acreditam, por isso muitas companhias tomam partido e competem para serem escolhidas como seu local de trabalho”.
Depois do massacre de Parkland, na Flórida, onde um aluno matou 17 pessoas, as redes Walmart, Dick’s Sporting Goods e Kroger elevaram de 18 para 21 anos a idade mínima para comprar uma arma. Empresas como Hertz, MetLife e Best Western suspenderam sua política de descontos para membros da Associação Nacional do Rifle (NRA, na sigla em inglês). A companhia aérea Delta cancelou um desconto de viagem para os filiados à NRA, o que levou legisladores republicanos da Geórgia a retaliarem revogando uma isenção de impostos sobre combustíveis equivalente a 50 milhões de dólares (191,5 milhões de reais). “Quando as companhias tomam partido devem fazê-lo de maneira multidirecional. Não podem pensar somente em seus clientes, também precisam considerar seus investidores e empregadores. Todos são importantes”, diz King. “Os executivos têm que ouvi-los mais”, acrescenta Korschun.
Segundo as pesquisas do professor da Drexel, os clientes preferem que as companhias tomem partido mesmo quando não se alinham com suas posturas. Valorizam a transparência acima da zona cinzenta. “Ainda há uma percepção de que se envolver é negativo. Isto porque o risco é supervalorizado, e deixar de assumi-lo é algo subestimado”, explica. King desconhece essa premissa, e defende que 90% dos clientes não sabem que lado defende a companhia da qual está comprando, e que muitas professam uma coisa e fazem outra. Ele salienta que tudo depende do ramo de atividade da companhia, e cita como exemplo a Patagonia, marca de roupa esportiva sustentável. “É normal que nesse caso os consumidores esperem que a empresa respeite o meio ambiente”.
O veto fronteiriço dos Estados Unidos aos imigrantes de sete países de maioria muçulmana irritou muitas empresas tecnológicas. Google, Facebook, Twitter e Uber expressaram seu descontentamento argumentando que a medida afeta muitos de seus empregados e poderia repercutir negativamente em seus negócios. “O perigo do ativismo corporativo é quando as empresas procuram manipular os clientes. O mesmo vale para os empregados. O chefe não pode obrigar seus trabalhadores a irem a campanhas ou doarem dinheiro para suas causas pessoais”, observa Korschun. King esclarece que não há como saber se estamos sendo manipulados, mas diz que os clientes mais sérios podem fazer a tarefa de revisar o histórico das empresas, ver a quem fizeram doações e quais certificados possuem.
O ativismo corporativo não nasceu com Trump. Nos anos sessenta, o supermercado Woolworth, na Carolina do Norte, tentou proibir a entrada de afro-americanos em suas lojas, quando o movimento dos direitos civis já havia atingido seu ponto de inflexão. A Disney também protagonizou um caso muito divulgado em 1996, quando apoiou os direitos dos homossexuais celebrando o Dia Gay. O que é fato é que há cada vez mais pressão sobre as empresas e, portanto, são cada vez mais as que aderem. “Essa reviravolta é inevitável, as companhias que não estão fazendo isso estão demorando, porque agora é assim que o negócio funciona”, conclui Korschun.
[Tens de ter uma conta e sessão iniciada para poderes visualizar este link]
Re: Polarização política nos EUA obriga empresas a tomarem partido
Bem interessante.
Essas empresas não ligavam para o que ele fazia enquanto ele brigava com outros países por mais mercado e, a despeito da conduta destrutiva dele, a economia só melhorava.
Essas empresas não ligavam para o que ele fazia enquanto ele brigava com outros países por mais mercado e, a despeito da conduta destrutiva dele, a economia só melhorava.
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